O PAPEL DA EDUCAÇÃO NA CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA E DA DEMOCRACIA

02/02/2022

É característica da democracia uma tensão entre os interesses dos diferentes grupos da sociedade, mas também o grande poder que subjaz na possibilidade de esses pontos de vista conviverem em sua pluralidade. Isso significa dizer que escolhas individuais não podem se sobrepor a acordos e leis coletivas e que há um respeito e entendimento sobre direitos e deveres. Qual, então, o papel da educação na construção da cidadania e da democracia?

Sabemos que as boas escolas são aquelas que nos preparam para a vida, com toda a sua riqueza de experiências, não apenas para uma atividade profissional específica. No que diz respeito ao bom exercício da vida pública, numa democracia, é necessário educar e preparar os indivíduos para que se tornem cientes dos seus direitos e deveres como cidadãos, e para que possam ajudar a zelar pelos valores em que a democracia se apoia: o respeito à vida humana, o respeito à constituição, às diferenças e o combate às desigualdades.

Sabemos que o século XXI viu nascer uma nova onda conservadora no mundo, que em nosso país os limites do estado democrático têm sido ostensivamente testados nos últimos anos e muitos direitos arduamente conquistados vêm sendo subtraídos da população. Temos acompanhado o ressurgimento de ideias e práticas fascistas que, até recentemente, pensávamos fazer parte apenas do nosso passado histórico.

Mas, afinal, de que forma a educação se articula com esse processo, em meio a um grande conflito de interesses e a uma drástica polarização política?

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A RELAÇÃO ENTRE DIREITO À EDUCAÇÃO E JUSTIÇA SOCIAL

O direito à educação de qualidade, pública e gratuita, de preferência, é ao mesmo tempo uma conquista e a força que move uma sociedade em busca de justiça social. Isso decorre do fato de o acesso aos estudos proporcionar novas oportunidades de mobilidade social, além da aprendizagem a respeito das questões políticas, históricas e culturais. Assim, o conhecimento empodera o estudante que se sabe cidadão ciente do seu próprio papel na sociedade. O resultado são pessoas que conseguem enxergar a realidade social de maneira crítica, além de deter maior poder de atuação e assim propor soluções para os desafios oferecidos pela vida individual e coletiva.

A educação também está relacionada ao estabelecimento de discussões éticas, da aprendizagem da convivência em grupo e da assimilação de valores a partir da experiência. Tudo isso, claro, é atravessado pela aprendizagem proporcionada pelo cotidiano na família, nos espaços coletivos e nas relações interpessoais em geral. Portanto, pode-se dizer que a construção de saber é exercida pela experiência tanto acadêmica quanto de convivência.

O direito à educação promove maior acesso a oportunidades ao longo da vida. Quanto maior o índice de escolarização de uma nação, maiores são os índices de qualificação e remuneração do trabalho, bem como os de qualidade de vida, saúde e felicidade. Inúmeros estudos sociológicos e pesquisas demográficas já realizadas apontam que o crescimento de tais indicadores está diretamente ligado com a queda dos números relacionados à criminalidade e ao encarceramento da população pobre.

A RELAÇÃO ENTRE OS REGIMES AUTORITÁRIOS E A REPRESSÃO AO PENSAMENTO CRÍTICO

Nos regimes autoritários, a repressão ao pensamento crítico é uma prática corriqueira. Os ditadores só conhecem a censura e a violência como modo de lidar com as diferenças. Por isso preferem se dirigir à massa acéfala, cujo comportamento é programado e que assimila sem pensar as ideias do líder tomado como o salvador da pátria. É esse o conceito de “povo” que acaba por constituir a base estruturante de um governo autoritário.

Quando a escolarização é deficiente ou demasiadamente dirigida pelo regime doutrinário (por exemplo, através das censuras dos revisionismos históricos), o objetivo pleno da educação já encontra-se em risco. A perseguição a professores e artistas que vem sendo empreendida por parte da extrema direita parece fazer parte de um esforço concentrado em desmoralizar e desvalorizar nosso patrimônio histórico-cultural.

Professores e artistas são os principais agentes que despertam o pensamento crítico, pois suas profissões são naturalmente provedoras de questionamentos e desafios às ideias dominantes. A arte trabalha o conhecimento em múltiplas linguagens e com um grande nível de sensibilidade, ao passo que a educação age principalmente ao instigar a postura questionadora e ciente dos próprios direitos e deveres dentro de um contexto social, político e cultural.

Aprendemos com Paulo Freire que a pedagogia pode ser libertária, pois tem o poder de promover a autonomia do sujeito, para que este construa as próprias reflexões e valores. Sua metodologia permite despertar a consciência política e promover a inclusão social, especialmente das pessoas que estão marginalizadas na sociedade.

Trata-se de uma forma de trabalhar o conhecimento que estimula o empoderamento do sujeito, ao mesmo tempo que estabelece uma postura crítica, capaz de questionar os poderes e privilégios da classe dominante. Daí o motivo de, em um regime fascista, as pedagogias de Paulo Freire serem combatidas.

O PAPEL DA NAU EDITORA NESSE CENÁRIO

A NAU é muito ciente de que seu papel como editora não se limita à publicação de livros, mas abrange também uma necessária atitude em defesa da sobrevivência da nossa democracia, dos direitos humanos e das liberdades civis que estão em jogo. Somos aliados das forças progressistas e declaradamente adeptos do movimento antifascista. Buscamos divulgar o que há de melhor na produção de pensamento atual, promovendo um debate aberto de ideias plurais, mas sobretudo no intuito de resistir ao crescimento da ultradireita no Brasil e no mundo.

Nossa missão é afirmar princípios e valores que nos libertem da violência sistematizada que oprime e submete a sociedade, em especial as chamadas minorias. Usando o livro como arma em meio à guerra cultural, buscamos enfraquecer o fascismo e, com ele, o racismo, a violência de classe, de sexo, de gênero, de orientação sexual – enfim, todas as formas de violência do patriarcalismo.