Obra de arte total, porém libertadora: as possibilidades democráticas da arte multilinguística no século XXI

10/08/2022

O que um poema, uma performance e uma pintura poderiam ter em comum, para além da palavra “arte”?

Gesamtkunstwerk.

O termo alemão é grande e difícil de pronunciar, e apesar de representar um conceito complexo, em português a sua tradução é bastante simples: obra de arte total.

O conceito estético de obra de arte total é oriundo de idealistas românticos alemães do século XIX, que viam a arte de sua época, segmentada em linguagens separadas, como uma versão decadente das antigas artes greco-romanas – cuja integralidade tinham intenção de resgatar.

Para sermos precisos, o gesamtkunstwerk foi inicialmente formulado pelo filósofo alemão Karl Trahndorff no ano de 1827, no ensaio intitulado “Estética ou Doutrina da Cosmovisão e Arte” (Ästhetik oder Lehre von Weltanschauung und Kunst, em tradução livre): 

Falamos anteriormente, na seção da arte do Som da Palavra (§. 57 S., 2z), sobre o fato de que as quatro artes, chamadas de arte do Som da Palavra, da Música, da Mímica e da Dança, têm a possibilidade de fluir em conjunto. No entanto, essa possibilidade é baseada em um comando que existe em toda arte que se esforça para formar uma Gesamt-kunstwerk  por  parte  de  todas  as  formas  da  Arte.  É  uma  busca  que  existe  originalmente em todo campo da arte. Uma vez que é reconhecida a unidade de sua  existência,  esta  possibilidade  não  se  dá  apenas  nas  artes  acima  mencionadas,  mas em todas. (TRAHNDORFF, 1827, p.312).

De acordo com essa concepção, a ideia diz respeito, inicialmente, à possibilidade de uma criação artística híbrida que compreende em si a multiplicidade e beleza das várias formas e tipos de linguagem artística: música, artes cênicas, canto, dança, arquitetura e artes plásticas. 

Alguns anos depois, disposto a transformar essa ideia em experiência real e concreta, o célebre compositor alemão Richard Wagner foi quem de fato popularizou o termo através de seus estudos, empreendimentos e composições operísticas. Na mesma esteira dos românticos de sua época, o compositor acreditava que a pintura, a música e a poesia já haviam alcançado o fim do seu processo evolutivo e, no futuro, a inovação na arte se daria através da combinação entre linguagens artísticas dentro de um mesmo espetáculo. Quando a analisamos retrospectivamente a partir de parâmetros mais atuais (como a tendência ao hibridismo das linguagens, o uso dos recursos eletrônicos, multimídia, de “samplagem”, etc.), essa ideia chega a parecer um tipo de profecia.

Na prática, Wagner cuidou de detalhes que proporcionavam ao público de suas óperas (ou “dramas Musicais”, conforme ele preferia chamá-las) uma verdadeira experiência imersiva em que todos os sentidos eram estimulados através de recursos como o escurecimento do teatro, os efeitos sonoros e cenográficos, e de toda a arquitetura do espaço, incluindo o rebaixamento da orquestra e o reposicionamento dos assentos. Até mesmo na construção de seu Bayreuth Festspielhaus, casa de ópera especialmente construída para os espetáculos do compositor e ainda em funcionamento na Baviera, cada detalhe contava, proporcionando uma verdadeira revolução na forma até então conhecida de se fazer arte.

Entretanto, para além do espetáculo, esta proposição de Wagner teve implicações políticas controversas, como a crítica à cultura e ao Estado modernos, em processos que envolveram transformações e revoluções da burguesia alemã da época; Wagner procurava estabelecer uma via de futuro para a arte e para a sociedade modernas, depositando uma esperança utópica na construção do porvir, baseada na ideia de totalidade em todas as dimensões da vida. A maneira como esses ideais de Wagner foram posteriormente apropriados e manipulados pela ideologia nazista é bastante conhecida e  já foi extensamente criticada. Sabemos que há uma vertente histórica da cultura dos valores clássicos que alimenta ideologias totalitárias. É evidente que este tipo de apropriação manipuladora deve ser rechaçada. Porém, há outras formas de extrair experiências e significados do conceito wagneriano de obra de arte total que não são a absolutista e totalitária, nem passam pelo reacionarismo fascista, mas, muito ao contrário, defende uma ideia do “universal” mais democrático e inclusivo.

Quase 200 anos após a formulação inicial do conceito de obra de arte total, apresentam-se ao mundo as novas e diversas formas de desenvolver a arte híbrida: as produções cinematográficas, os espetáculos e instalações imersivas, a realidade virtual e aumentada, as obras que misturam o tátil ao auditivo e ao visual, as inúmeras tentativas de produzir experiências e sensações sinestésicas… 

Diante de todos estes novos recursos sequer imaginados pelos românticos alemães, é possível aplicar o conceito de obra de arte total a uma publicação editorial? Pode o livro se tornar veículo de experiências de fruição diversas das lítero-visuais tradicionais para incluir as artes sonoras, dramáticas, performáticas e audiovisuais?

Esta é justamente a proposta do projeto ARTE EM PENCA: uma publicação de arte impressa de obras selecionadas pela NAU Editora, através de convocatória aberta.

O projeto ARTE EM PENCA é uma entre outras tantas propostas de possível “organização” da babel midiática atual e de reinvenção da forma conhecida como “livro” no mundo digitalizado. Seu caráter “enciclopédico”, que visa compilar e agregar, não se apresenta com qualquer intenção de fechar ou totalizar, mas sim de abrir possibilidades – quantas forem possíveis.

Para além das publicações tradicionais de livros – que costumam envolver apenas palavras e imagens –, este projeto abrange também música, performance, videoarte e outras linguagens artísticas, visando proporcionar uma experiência tão imersiva quanto a obra de arte total ambicionada por Richard Wagner há quase 200 anos, porém mestiça, híbrida, democrática e libertária.

Conheça mais sobre o projeto abaixo:

PARA QUEM SE DESTINAM AS INSCRIÇÕES?

As inscrições estão abertas  ao público em geral, independentemente de idade, cidade, estado, nacionalidade, formação profissional ou experiência artística – desde que sejam residentes em território nacional.

SOBRE O TEMA

Os participantes devem submeter seus trabalhos que tenham afinidade com o tema “Desejo e Solidão”. As obras deverão levantar questões como sensualidade, desejo, solidão, frustração e seus desdobramentos, assim como o conceito de conexão e suas faltas em tempos de incerteza.

A Comissão Curatorial busca respostas criativas sobre o tema supracitado. Originalidade, relevância social e coesão conceitual são algumas das características favoráveis.

SOBRE O ENVIO DO MATERIAL

O envio do material, seja ele em texto, imagem, áudio ou vídeo, deverá ser realizado única e exclusivamente via formulário de inscrição (clique aqui para acessá-lo).

Veja as especificações para o envio das obras:

Imagem: em alta resolução (mínimo de 3.000 pixels no lado menor); em qualidade suficiente para impressão. Formatos: TIFF, JPG e PNG.

Texto: em formato editável, como arquivo .doc, .docx ou equivalentes. Máximo de 3.600 caracteres, considerando espaços.

Áudio ou vídeo: deverá ser disponibilizado um link de acesso (não restrito) no formulário. 

SOBRE O SISTEMA DO PROJETO

O projeto conta com um sistema de financiamento colaborativo, onde a taxa de inscrição corresponde à compra do livro em pré-venda. Ou seja, ao se inscrever, o participante já garante o seu próprio exemplar do projeto.

Veja como garantir o pagamento de sua taxa de inscrição clicando neste link.

ATÉ QUANDO VÃO AS INSCRIÇÕES?

As inscrições vão até o dia 14 de agosto de 2022, às 23h59.

Para mais informações, acesse aqui o regulamento completo do projeto ARTE EM PENCA.

Você também pode tirar eventuais dúvidas através do e-mail projetos@naueditora.com.br